A hora ideal para tirar o filhote da ninhada
Não leve pra casa um filhote de cachorro com menos de 3 meses. Dá pra entender. Quando decide-se por comprar ou adotar um cachorro, a ansiedade começa a falar cada vez mais alto e tudo que se quer é ter o filhotinho dentro de casa, correndo, brincando e sendo muito amado. Infelizmente poucas pessoas sabem da importância da convivência dos filhotes com a mãe e a ninhada nos seus primeiros meses de vida. A maioria das pessoas tende a levar pra casa o filhote com 60 dias (2 meses), uma grande parte com 45 dias e tem pessoas que chegam a levar um filhote com 30 dias pra casa. Por ansiedade ou por ignorância, isso acaba sendo muito prejudicial para o cão, psicologicamente falando. Depois tornam-se cães com desvios comportamentais graves que são difíceis de reverter. E aí muitos desses cães que eram filhotes fofinhos passam a ser indesejados pelos donos e são doados, abandonados e às vezes até sacrificados!
Nossa função é ensinar e orientar donos e futuros donos de cães. Então vamos explicar agora porque você não deve adquirir um cão com menos de 3 meses de idade.
Primeiramente, desconfie de um criador que deixe o futuro dono levar o filhote com menos de 90 dias de vida. Esse sem dúvida não é um criador sério e responsável, além de não saber sobre um assunto tão importante para o bem estar do animal e da família também. Infelizmente grande parte dos criadores só quer se livrar dos filhotes e do trabalho que a ninhada dá, liberando os filhotes com 60 dias de vida.
Imprinting
O desenvolvimento social de um filhote em sua matilha chama-se imprinting canino. O imprinting é uma das primeiras fases da vida de um animal (inclusive nós, humanos), que é quando ele vai aprender aspectos sociais e psicológicos da sua espécie, como comportamento e comunicação. Para simplificar, o imprinting canino é quando um cão aprende a ser um cão. No caso dos cachorros, o imprinting acontece entre o primeiro e o quarto mês de vida e é quando formam sua “personalidade”.
Quem primeiro descobriu a existência do imprinting foi o austríaco Konrad Lorenz, vencedor do Prêmio Nobel de Fisiologia/Medicina em 1973 pelos seus estudos sobre comportamento animal (etologia). Investigando gansos, ele descobriu que o imprinting acontece em um período curto chamado de período crítico ou período sensível.
Especificamente no caso dos cachorros, é durante esse período que eles desenvolvem a habilidade de comunicação com outros cães da matilha e aprendem a se posicionar socialmente na hierarquia. Como dito anteriormente, o que é (mal) aprendido nessa fase pode ser muito difícil e às vezes impossível de resolver.
Os cães vivem em matilhas. Uma mãe e seu filhotes não deixa de ser uma pequena matilha. Durante os primeiros passos dos filhotes de uma ninhada, a mãe e os outros cães adultos costumam permitir que os cãezinhos façam quase tudo. Porém, conforme vão ficando um pouco mais velhos, os cães adultos começam a não tolerar mais atitudes incorretas e indesejáveis (na visão de um cão), como por exemplo perturbar o sono de um cão adulto, latir sem ter nenhum motivo, roubar comida, desafiar o líder etc. Ou seja, os cães adultos corrigem e educam os filhotes entre o primeiro e o quarto mês de vida. Agora imagine você tirar de uma ninhada um filhote com 45 dias de vida. Depois é fácil entender porque o cão late sem parar, rosna pra todos e não respeita o espaço dos membros de sua nova matilha (você e sua família).
Outro ponto em relação à fase do imprinting: a questão do cão aprender a ser um cão. Isso é importante para que ele consiga acasalar sem problemas no futuro e saiba socializar com outros cães e até com as pessoas. É aí que ele vai aprender que cachorro é cachorro e pessoa é pessoa. Vão aprender a mostrar suas emoções para outros cães, como medo, vontade de brincar, etc.
Há ainda mais um agravante quando leva-se um cão para casa antes do terceiro mês de vida: sociabilidade. Como as vacinas só são completadas no terceiro para o quarto mês, o que acontece é que o filhote fica isolado dentro de casa e não tem contato com outros cães até ter tomado todas as vacinas. Ou seja, a chance de ele repudiar um cão estranho é grande, além dele não saber mostrar certos sinais comportamentais para os outros cães, tornando-se um cão anti-social.
Con Slobodchikoff, PhD, especialista no estudo da comunicação e sociabilização canina, afirma que quando um cão que foi retirado muito cedo da ninhada finalmente entra em contato com outros cães, ele não vai saber interagir com os seres da mesma espécie nem saberá o mínimo, como a saudação canina e formas de aproximação. Resultado: ele pode ficar com medo, fugindo e entrando em pânico perante esses seres estranhos (cães como ele!) ou irá responder de forma agressiva, pra se defender.
Um cão anti-social (que não foi sociabilizado pela sua mãe e irmãos quando filhote) é algo muito indesejável para qualquer dono, mesmo o mais experiente. Um cão anti-social rosna à toa, não confia nas pessoas e nem em outros cães. Morde uma criança que vai brincar com ele, avança na visita e não consegue ter um relacionamento saudável com outros cães, simplesmente porque ele não aprendeu a linguagem corporal dos cães e não entende o que está acontecendo – “o que é esse ser vindo me cheirar?”
Portanto, o ideal é segurar a ansiedade, se preparar para a chegada do filhote e ter a consciência de que isso é o melhor para o cão e para a família também. Uma dica é visitar a ninhada de 15 em 15 dias, para acompanhar seu crescimento e matar um pouquinho da vontade de levar o pequeno pra casa. Como dissemos, os danos que a retirada precoce da ninhada pode causar podem ser irreversíveis ou pode ser preciso muita paciência e experiência para corrigir os danos causados ao lado psicológico do cão. A melhor coisa a se fazer é esperar e deixar que o filhote fique com sua mãe e irmãos o máximo possível.